Extensão Universitária como Comunicação de Saberes: Diálogo entre Universidade e Sociedade
Série: Extensão Rural Revisão bibliográfica/ texto técnico nº4 Autor: Délcio Cesar Cordeiro Rocha
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3/4/2023
Extensão Universitária como Comunicação de Saberes: Diálogo entre Universidade e Sociedade
Série: Extensão Rural
Revisão Bibliográfica/Artigo Técnico nº 4
Autor: Délcio César Cordeiro Rocha
Introdução à Extensão Universitária
A extensão universitária emerge como uma prática essencial no cenário educacional contemporâneo, caracterizando-se por fomentar o intercâmbio de conhecimentos entre a universidade e a sociedade. Compreendida como um processo bidirecional, a extensão universitária não apenas dissemina conhecimentos gerados no ambiente acadêmico, mas também incorpora saberes populares e demandas sociais às suas atividades, configurando-se como um pilar fundamental nas instituições de ensino superior.
Essa integração entre a universidade e a comunidade local promove um diálogo contínuo e enriquecedor, permitindo que o saber acadêmico encontre aplicabilidade prática em contextos diversos. As ações de extensão universitária abrangem um espectro amplo de atividades, incluindo projetos sociais, cursos de curta duração, consultorias e eventos culturais, os quais visam atender às necessidades específicas das comunidades envolvidas e, por conseguinte, potencializar o desenvolvimento social e econômico.
Importa ressaltar que a extensão universitária transcende o simples ato de levar conhecimento ao público externo; ela pressupõe um movimento de troca e reflexão que enriquece tanto a universidade quanto a sociedade. Tal interação possibilita a revisão e atualização de currículos, a inserção de práticas inovadoras no ensino e a promoção de uma consciência crítica entre os estudantes. Dessa forma, a extensão universitária reforça o compromisso das instituições de ensino superior com a responsabilidade social e a transformação da realidade.
Portanto, ao explorar a extensão universitária como um canal de comunicação de saberes, reconhece-se sua capacidade de fortalecer vínculos, democratizar o acesso ao conhecimento e promover a cidadania. Mais que uma prática complementar, a extensão universitária se configura como um elemento vital na missão educativa das universidades, ampliando seus horizontes de atuação e reafirmando seu papel como agentes de mudança social.
Paulo Freire e a Perspectiva Dialógica
A concepção de Paulo Freire sobre a relação entre acadêmicos e a sociedade é fundamentada em sua filosofia educacional, que privilegia o diálogo e a reflexão crítica sobre a realidade concreta. Freire propõe uma educação problematizadora, onde a extensão universitária é vista como um processo de troca mútua de conhecimentos e experiências, superando a visão tradicional de transmissão unidirecional de saberes. O foco está no engajamento ativo de ambas as partes — universidade e comunidades — em um processo contínuo de aprendizagem e desenvolvimento.
Freire sustenta que a educação deve ser uma prática libertadora, enraizada no contexto histórico e cultural dos envolvidos. Nesse sentido, a extensão universitária torna-se um espaço crucial para a construção de um conhecimento coletivo, no qual os atores sociais compartilham saberes, interpretam suas realidades e, juntos, buscam soluções para os desafios cotidianos. Esse intercâmbio dialógico fomenta não só o enriquecimento acadêmico, mas também a emancipação das comunidades, fortalecendo seus laços e auto-organização.
Além disso, o diálogo promovido pela extensão universitária segundo Freire não é meramente uma troca de informações, mas um processo de conscientização, no qual a criticidade e a análise profunda das realidades vivenciadas são incentivadas. A partir desse ponto de vista, os acadêmicos não são mais vistos como detentores do conhecimento absoluto, mas sim como facilitadores que, ao lado das comunidades, trabalham de maneira colaborativa para alcançar objetivos comuns.
Assim, a perspectiva dialógica defendida por Paulo Freire proporciona uma nova visão da extensão universitária como um ambiente de interações significativas, produtivas e transformadoras. É um convite à reflexão coletiva, visando promover um desenvolvimento integral que transcenda as barreiras institucionais e socioeconômicas. A troca de saberes e experiências entre a universidade e a sociedade, portanto, é essencial para construir um conhecimento verdadeiro que seja relevante e aplicável nas vidas das pessoas e no contexto em que estão inseridas.
Ações Extensionistas: Curriculares e Extracurriculares
As ações extensionistas desempenham um papel essencial na interface entre a universidade e a sociedade, promovendo a difusão de conhecimentos e incentivando o engajamento social. Tais ações podem ser categorizadas em curriculares e extracurriculares, cada uma com suas peculiaridades e contribuições específicas.
As ações extensionistas curriculares são aquelas que estão integradas aos programas de ensino e são obrigatórias para os estudantes. Elas são desenvolvidas por meio de disciplinas, projetos ou atividades que fazem parte do currículo acadêmico. Um exemplo prático é a inserção de projetos de extensão nas licenciaturas, onde os alunos têm a oportunidade de aplicar conhecimentos adquiridos em sala de aula diretamente em escolas, contribuindo para a formação de futuros educadores e para a melhora do ensino básico. Outra ilustração são os cursos de medicina e enfermagem que envolvem estágios em comunidades carentes, proporcionando atendimento médico e orientação para a população, enquanto oferecem aos estudantes uma experiência prática e humanitária.
Em contrapartida, as ações extensionistas extracurriculares são atividades voluntárias e não obrigatórias, realizadas paralelamente ao currículo regular dos cursos. Essas iniciativas possibilitam aos alunos ampliar e aprofundar seus conhecimentos em áreas específicas de interesse. Um exemplo marcante são os projetos de voluntariado, como programas de alfabetização para adultos, onde estudantes de diversas áreas atuam como educadores, contribuindo para a erradicação do analfabetismo. Empresas juniores, geridas por alunos, também são expressões de ações extracurriculares, proporcionando uma vivência de mercado e desenvolvimento de habilidades empreendedoras.
Tanto as ações curriculares quanto as extracurriculares são fundamentais para a formação integral dos alunos e para o fortalecimento do vínculo entre a universidade e a sociedade. Elas não apenas favorecem o desenvolvimento social, atendendo a demandas concretas da comunidade, mas também enriquecem o processo educacional, reafirmando a extensão universitária como um instrumento de transformação social e acadêmica.
Protagonismo dos Acadêmicos no Processo Extensionista
A organização e o desenvolvimento de atividades de extensão universitária pelos próprios acadêmicos são premissas fundamentais para a consolidação de uma formação crítica e autônoma. Essa abordagem promove não apenas o engajamento intelectual, mas também o crescimento pessoal dos estudantes, capacitando-os a agir como agentes transformadores na sociedade. Supervisionados por professores ou técnicos, os estudantes têm a oportunidade de aplicar seus conhecimentos teóricos em situações práticas, conectando a universidade diretamente com a comunidade externa.
O protagonismo dos acadêmicos no processo extensionista estimula a responsabilidade e o compromisso dos estudantes com o desenvolvimento de projetos que atendam às necessidades reais da sociedade. Ao serem desafiados a identificar problemas e criar soluções, os acadêmicos desenvolvem habilidades essenciais, como a capacidade de trabalhar em equipe, pensamento crítico e a gestão de projetos. Essas competências são indispensáveis no mercado de trabalho, permitindo que os estudantes saiam da universidade preparados para enfrentar desafios complexos em suas futuras carreiras profissionais.
Além disso, a interação com a sociedade proporciona aos estudantes uma compreensão mais profunda das dinâmicas sociais e culturais, ajudando a desmistificar conceitos teóricos e aproximá-los da realidade. Essa experiência prática é crucial para a formação integral dos acadêmicos, que se tornam mais conscientes de seu papel como cidadãos e profissionais. Dessa forma, a universidade se reafirma como um espaço de transformação social, produzindo conhecimento que é simultaneamente relevante e aplicável.
A supervisão de professores ou técnicos é igualmente importante para garantir a qualidade e a rigorosidade dos projetos de extensão. Essa orientação permite que os estudantes recebam feedback construtivo e direcionamento ao longo do processo, multiplicando assim os benefícios da atividade extensionista. Em essência, o protagonismo dos acadêmicos no processo extensionista não só enriquece a formação deles, como também fortalece o vínculo da universidade com a sociedade, promovendo um diálogo contínuo e eficaz entre esses dois universos.
A Extensão em Conjunto com as Comunidades
A prática da extensão universitária é fundamentada na parceria ativa entre a universidade e as comunidades, promovendo um intercambio constante de saberes e experiências. Esta interação se manifesta de várias maneiras, atendendo às necessidades específicas das comunidades e levando em consideração a realidade vivenciada por elas. As ações de extensão são, portanto, elaboradas em conjunto, permitindo que o conhecimento académico se integre com o saber local e as verdadeiras necessidades das populações envolvidas.
Os projetos colaborativos são marcantes exemplos dessa sinergia. Um caso notável é o projeto de assistência técnica em agricultura sustentável, onde alunos e professores de uma universidade pública trabalham diretamente com agricultores locais. Este projeto busca implementar técnicas de cultivo que respeitam o meio ambiente e aumentam a produtividade, aliando o saber científico dos universitários com o conhecimento empírico e as tradições dos agricultores. Tal colaboração resulta em benefícios mútuos, com impactos significativos tanto para a comunidade rural envolvida quanto para os estudantes, que obtêm uma formação prática e contextualizada.
Outro exemplo é o programa de educação inclusiva, desenvolvido por uma equipe interdisciplinar da universidade. Neste projeto, os universitários colaboram com escolas locais para criar materiais didáticos adaptados para alunos com necessidades especiais. A formação dos professores das escolas e a conscientização da sociedade sobre a educação inclusiva são objetivos centrais desta ação. As comunidades escolares participantes testemunham uma melhora na qualidade do ensino e na inclusão efetiva dos estudantes, enquanto os acadêmicos ganham experiência prática e conhecimento aprofundado sobre as práticas educacionais.
Essas parcerias são reflexos do compromisso da universidade com a sociedade, permitindo que os saberes acadêmicos e populares se complementem e gerem transformações sociais positivas. A extensão universitária, portanto, configura-se como um espaço dinâmico de troca e aprendizado contínuo, essencial para o desenvolvimento comunitário e para a formação integral dos estudantes.
Feedback e Melhoria Contínua na Extensão Universitária
A extensão universitária desempenha um papel crucial ao promover a interação entre a universidade e a sociedade, criando um fluxo bidirecional de conhecimentos e experiências. Neste contexto, o feedback contínuo emerge como uma ferramenta essencial para a avaliação e aprimoramento das práticas extensionistas. A troca de percepções entre os acadêmicos e a comunidade beneficiada permite a identificação de pontos fortes e áreas que necessitam de desenvolvimento, possibilitando ajustes e inovações nas abordagens utilizadas.
O feedback proveniente da comunidade desempenha um papel fundamental na relevância das ações extensionistas. A resposta dos participantes oferece uma visão clara sobre as necessidades e expectativas locais, permitindo à universidade recalibrar seus projetos para que sejam mais eficazes. Por exemplo, se um programa de educação ambiental evidencia certas lacunas no conhecimento local, podem ser incluídas novas oficinas ou módulos educativos para preencher esses vazios.
Além disso, a avaliação e o feedback acadêmico são igualmente vitais. Estudantes e professores envolvidos em atividades de extensão possuem uma perspectiva única sobre a execução e os resultados desses projetos. Reflexões internas sobre a aplicabilidade dos métodos usados, a interação com a comunidade e os resultados observados contribuem significativamente para a refinamento da estratégia de extensão. Essas revisões internas garantem que os programas não apenas alcancem, mas excedam seus objetivos, ao mesmo tempo em que enriquecem a experiência educacional dos alunos.
A implementação de ciclos contínuos de feedback reforça a eficácia e relevância dos projetos de extensão universitária. Ferramentas como pesquisas de satisfação, grupos focais e encontros de avaliação são críticas para capturar essas percepções de forma estruturada. Quando a retroalimentação é considerada e aplicada, contribui para um processo dinâmico de evolução, garantindo que as iniciativas permaneçam alinhadas com as necessidades emergentes da comunidade (pesquisada, analisada e avaliada) os avanços acadêmicos.
Referências
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Como Citar:
Portal AGROECOBRASIL. ROCHA, Délcio César Cordeiro. A Extensão Universitária como Comunicação de Saberes, Diálogo entre Universidades e Sociedade Série: Extensão Rural nº4. Publicado em 2023 Disponível em: https://agroecobrasil.com/extensao-universitaria-como-comunicacao-de-saberes-dialogo-entre-universidade-e-sociedade. Acesso em DIA/ MÊS/ ANO
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Sobre o coordenador do Site www.agroecobrasil.com:
Délcio César Cordeiro Rocha
Zootecnista - Escola Superior de Ciências Agrárias de Rio Verde- ESUCARV- GO
Especialista em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual do Centro-oeste UNIOESTE-PR
Mestrado em Agronegócios - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. UFRGS-RS
Doutor em Zootecnia - Universidade Federal de Viçosa. UFV-MG
Ministra as Disciplinas:
Agroeconegócios
Conservação e Manejo e de Fauna,
Zoologia,
Etologia e Bem Estar Animal,
Animais Silvestres,
Criação e Exploração de Animais Domésticos,
Extensão Rural,
Educação e Interpretação Ambiental
Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG / Montes Claros. Para os cursos de Agronomia, Eng. Florestal, Eng. Agrícola e Ambiental , Zootecnia
Coordenador do Grupo de Estudos em Etologia e Bem-estar Animal - GEBEA
Coordenador do PROGRAMA de Extensão: “Ambiente em Foco/ "Meio- ambiente e Cidadania" e dos Projetos:
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